Entrevistas com Pedro G. Drummond e Antônio Carlos Secchin

16/04/2020 20:06

Em entrevista para uma pesquisa específica sobre a produção cronística de Carlos Drummond de Andrade, Pedro Augusto Graña Drummond, neto do autor, organizador do diário Uma forma de saudade (2017) e divulgador da obra do avô, respondeu às perguntas feitas, enviando também, gentilmente, áudios da entrevista concedida por Drummond à filha Maria Julieta em 1984 e publicada pelo selo Luz da Cidade.

 

. Sobre o livro Uma forma de saudade, publicado pela editora Companhia das Letras:

 

1 Como foi abordado na apresentação da obra, já que as lembranças ainda eram vivas e evidentes, para quê ou para quem o diário de CDA foi escrito?

R: Sugiro ouvir os trechos da entrevista em anexo.

 

2 Como se deu a destruição desse material e quais foram os critérios usados na escolha das páginas entregues à família?

R: O livro Uma forma de saudade - Páginas de diário contém as páginas do diário que ele entregou a mamãe e que ficaram guardadas durante todos estes anos, portanto sempre estiveram com minha família. O próprio Carlos explica a razão pela que destruiu o que não foi publicado desse diário na entrevista que concedeu a mamãe.

 

3 O diário foi elaborado em que período da vida de Drummond? Na velhice?

R: Como ele próprio diz na citada entrevista e como se desprende das datas nas próprias páginas, ele foi escrevendo o diário regularmente, após os acontecimentos narrados.

 

4 De quem foi a iniciativa da publicação do material?

R: Nos anos 80 Carlos publicou O observador no escritório. No ano passado eu mesmo decidi publicar Uma forma de saudade.

 

. Sobre a relação de Carlos Drummond de Andrade com a esfera jornalística:

 

1 Como foi, na época de suas publicações, a recepção de seus livros dedicados à crônica pelo público leitor?

R: Não posso responder pois passei minha infância e adolescência na Argentina e não acompanhei essas publicações.

2 Além de serem consideradas "mais artísticas" pelo autor, quais foram os critérios para a seleção das 600 crônicas que ocuparam os livros, dentre as seis mil produzidas durante toda a vida do autor para os jornais?

R: Lamentavelmente não podemos contar com a opinião do próprio autor, que não está mais conosco, para responder a esta questão. Sugiro consultar os especialistas que mencionei.

 

3 Em que circunstâncias se deu o desligamento de CDA do JB? (relatado de forma leve e repleta de lirismo na crônica "Ciao" (1984) 

R: Acredito que a crônica Ciao explica tudo claramente. Na época, Carlos decidiu parar (depois de umas seis décadas de "cronicar" como ele mesmo dizia) e deixar o espaço para novos escritores.

 

4 Como o autor distinguia as funções de jornalista e poeta? Para ele, havia distinção entre a escrita literária e a escrita profissional, voltada ao mercado?

R: Ele não pensava no mercado quando escrevia. Era um escritor profissional e, como jornalista, vivia de seu trabalho. Pelo que soube dele mesmo, ele não projetava os livros mas os ia montando a medida em que escrevia motivado pela inspiração ou por acontecimentos que o comoviam.

 

5 A partir do uso da primeira pessoa do plural e da projeção na figura do "cronista" em seus textos, havia a intenção do autor de afastar-se do discurso autobiográfico e de aproximar-se de uma memória mais "coletiva"?

R: Esta é outra pergunta que os estudiosos poderão responder melhor do que eu. Entre tantas crônicas que publicou em jornais, pode destacar-se o alter-ego João Brandão, personagem em quem Carlos botou várias opiniões pessoais.

 

6 Que número de edições alcançam hoje seus livros dedicados à crônica?

R: Não levo a conta do número de edições de seus livros, até porque seus livros foram publicados por mais de uma editora. Ele costuma ser mais reconhecido por sua obra poética do que como prosador.

 

7 Como você percebe a repercussão dessa produção cronística no ambiente acadêmico?

R: Não deixa de ser notável que sua obra desperte interesse nos meios acadêmicos, mesmo passados mais de 30 anos de sua morte. Mais impressionante ainda é o carinho que as pessoas ainda guardam por ele e sua obra. Nestas últimas 3 décadas foram publicados muitos livros de estudos e ensaios sobre sua obra com diversas abordagens.

 

Sobre a produção cronística de Carlos Drummond de Andrade e sua atuação nos jornais, respondeu às mesmas perguntas Antônio Carlos Secchin, membro da Academia Brasileira de Letras, professor emérito da UFRJ, poeta e ensaísta.

 

 1 Como foi, na época de suas publicações, a recepção de seus livros dedicados à crônica pelo público leitor?

R: Bastante boa. Todos os seus livros de crônicas foram reeditados, alguns várias vezes, o que nem sempre ocorreu com os livros de poesia.

 

2 Além de serem consideradas "mais artísticas" pelo autor, quais foram os critérios para a seleção das 600 crônicas que ocuparam os livros, dentre as seis mil produzidas durante toda a vida do autor para os jornais?

R: Creio que ele nunca explicitou outro critério que não fosse a possível maior qualidade literária do material solicitado.

 

3 Em que circunstâncias se deu o desligamento de CDA do JB? (relatado de forma leve e repleta de lirismo na crônica "Ciao" (1984)

R: Tudo leva a crer que ele se sentiu exaurido para a tarefa, após tantos anos na prática do ofício.

 

4 Como o autor distinguia as funções de jornalista e poeta? Para ele, havia distinção entre a escrita literária e a escrita profissional, voltada ao mercado?

R: Certamente. Crônica era obrigação profissional, ganha-pão.

 

5 A partir do uso da primeira pessoa do plural e da projeção na figura do "cronista" em seus textos, pode- se dizer que havia a intenção do autor de afastar-se do discurso autobiográfico e de aproximar-se de uma memória mais "coletiva"?

R: Como em toda obra literária, o “eu” e o “nós” ora se aproximam, ora se distanciam. Difícil estabelecer nítida fronteira entre o individual e o coletivo.

 

6 Que número de edições alcançam hoje seus livros dedicados à crônica?

R: Essa informação pode ser colhida com mais precisão junto à editora que atualmente reedita a obra de Drummond, a Companhia das Letras.

 

7 Como você percebe a repercussão dessa produção cronística no ambiente acadêmico?

 R: Repercussão moderada, uma vez que o gênero, independente da qualidade do cronista, continua sendo visto como algo “menor”.

 

A entrevista comprovou a importância e o reconhecimento da produção em prosa de Carlos Drummond de Andrade, apesar de, no ambiente acadêmico, ainda ser menos estudada e considerada inferior à sua produção em verso.

 

* Entrevista realizada em 2018